segunda-feira, 21 de março de 2011

A etiqueta da amizade


No carnaval escrevi um livro infanto-juvenil sobre o bullying do consumismo. Foi minha amiga Elsa quem sugeriu. Psicóloga, ela trabalha com crianças e adolescentes e comentou o quanto sofrem pais e filhos atualmente com as tentações da mídia.  

O ser humano deixou de andar nu como os índios e passou a ser escravo de si mesmo, numa busca interminável pelo topo de uma imaginária montanha da felicidade vinculada ao status material. Se nós, adultos, nos deixamos sucumbir pela tentação, o que podem fazer as crianças? Considerando que os pequenos não entendem o mecanismo das campanhas publicitárias, como explicar?  Eles não sabem que o cantor preferido muitas vezes nem conhece a fábrica que produz o brinquedo que leva seu nome. Apresentadoras de TV sabem cantar e dançar, mas não sabem como se costura uma roupa ou monta-se um laptop. Precisamos passar às crianças a desvinculação da etiqueta do produto.  Mostrar que ela pode usar um computador sem foto de artista, mas não pode usar a foto do artista sozinha.

 Você pode vestir uma blusa se cortar a etiqueta, mas não pode se vestir somente com etiquetas. No livro, conto o caso de uma bolsa que é feita pela tia de uma criança e custa quatro vezes mais quando ela entrega para a fábrica que só costura a etiqueta com a marca famosa. 

Obviamente temos a questão da qualidade, algumas marcas são vinculadas ao desenvolvimento tecnológico, design e qualidade do produto. Mas cada vez mais essa realidade está mudando. A linha B das montadoras de eletrodomésticos, por exemplo, oferece o mesmo motor, o mesmo formato e só mudam a porta ou painel e o preço cai consideravelmente. 

Tem sido grande a repercussão da campanha de uma cerveja popular por uma cantora que é extremamente “certinha”. Brincadeiras como “Ela é devassa, usa esmalte diferente nos pés e nas mãos” comprovam que o sucesso da campanha foi atingido. Falem mal, mas falem de mim. A cantora já havia dito que não bebe cerveja. Agora ela vende cerveja. Segundo ela, fez uma pesquisa e o produto é realmente bom. Claro, ninguém vai associar sua imagem a um produto péssimo. Mas ninguém vai recusar um cachê milionário se o produto não for excelente. Assim, a concorrência é prejudicada. Quantos bons produtos não podem pagar um cachê desse nível? Enquanto isso, os pais deixam a televisão de babá e não verificam o que o filho assiste. Alguns se sacrificam para dar um tênis que vai para o lixo antes de terminar de pagá-lo. Nas escolas, as crianças destilam o veneno próprio da infância. Quem assistiu ao filme “A Fita Branca”, vai se lembrar das crianças que mentiam, culpavam a outra quando eram pegas, chegavam a machucar os menores e houve até morte. Em outro filme recente, o menino mata a menina porque queria ficar com seu animalzinho de estimação.  Claro que nem todas as crianças são assim cruéis, mas a verdade é que muitas não pensam duas vezes em praticar bullying. Risadas e apelidos são comuns nas escolas. 

As crianças acreditam que precisam adquirir certos produtos para serem respeitadas. A necessidade de inferiorizar o outro é uma busca doentia por sentir-se especial. Essa cultura contemporânea de medir o que somos pelo que temos tem que ser reavaliada. Tem que começar em casa. 

Não adianta falar para o nosso filho não criticar o que os amigos usam, se nós reparamos e valorizamos com comentários do tipo: “Você viu o relógio dele”?”“ Você viu o carro dela?”Ou nos referimos a objetos pelas marcas em vez de usarmos substantivos. Criança escuta, incorpora e transfere. 

Para nossos pequenos serem mais humanizados e menos materialistas, precisamos dar o exemplo. Cada um sabe de suas posses. Ter mais poder de consumo que o vizinho não significa ser melhor pessoa que ele. Os olhos precisam ser educados para enxergar o que realmente importa e que não tem etiqueta.

Como o vento e o perfume das flores.

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Comentários:

Anônimo disse...
Amiga!
Que bacana!
Se vc autorizar, quero colocar no blog paulista.
Bj,
Regina

terça-feira, março 22, 2011 4:27:00 PM
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 Anônimo disse...
Te admiro muito

terça-feira, março 22, 2011 4:28:00 PM
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 Anônimo disse...
Oi Simone, como de costume, uma reflexão para lá de pertinente!!!!!
Bj
Déborah

terça-feira, março 22, 2011 4:32:00 PM
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 Anônimo disse...
Grande texto, querida amiga.
Se vc me permitir, gostaria de postá-lo em um de meus blogs, com os devidos créditos, é claro.
Aguardo sua resposta.
Abraços
Roque

terça-feira, março 22, 2011 4:32:00 PM
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 Anônimo disse...
Muito bom! valeu!


Salete

terça-feira, março 22, 2011 4:32:00 PM
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 Anônimo disse...
Si, você está craque em críticas.Assunto, composição, explanação. Texto limpo. Dá prazer de lê-lo e ainda provoca reflexão. Amei!
Beijo
Repassando...

Rosana

terça-feira, março 22, 2011 4:33:00 PM
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 Anônimo disse...
Parabéns, adorei!
Te desejo um lindo fim de dia...Gabyz

terça-feira, março 22, 2011 4:33:00 PM
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 Anônimo disse...
Texto educativo bem feliz!
Bem escrito, com sequencia e lógica.

quarta-feira, março 23, 2011 7:33:00 AM
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 Anônimo disse...
Ops! Adorei a crônica

quarta-feira, março 23, 2011 7:34:00 AM
 Anônimo disse...
Muito bacana, Simone! Show!
Alex

quarta-feira, março 23, 2011 7:34:00 AM
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 Anônimo disse...
Ótimo texto! Um retrato perfeito do que acontece.
Abraços Carolina

quarta-feira, março 23, 2011 8:02:00 AM
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 Anônimo disse...
Oi querida, hoje é que tive tempo para ler, saboreando, este seu texto; gostei muito. Parabéns!
abç
Domitilla

sexta-feira, março 25, 2011 7:14:00 AM

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