quarta-feira, 23 de março de 2011

A despedida


“My heart has broken into a million
dying stars on a dark, dark sky.
Neither comets nor planets shall
ever candle my night again”.


Naqueles dias em que o passado bate a sua porta e você finge que não ouve, mas ele o espreita pela janela, o que fazer?Partidas sem despedidas deixam um vulto em nossas vidas. Muitas vezes, as pessoas são levadas pela morte na calada da noite. Outras, a doença nos anuncia a chegada e não sei dizer se sofremos menos por diluir em um prazo maior ou se simplesmente morremos um pouco a cada dia de espera.


Outras despedidas são impostas pela vida. Uma amiga saiu do emprego onde trabalhava há sete anos. Não foram poucas as lágrimas. Quantos laços criados em um ambiente de trabalho em que passamos mais tempo do que com a própria família? As promessas de reencontros são muitas. O tempo é implacável e aos poucos o esquecimento se apodera das relações. Talvez um ou dois colegas continuem a se encontrar. Para onde vão os sentimentos e os laços desenvolvidos nesse período? Emoções divididas, fotos de momentos marcantes e palavras de incentivo ou consolo: tudo desaparece de um momento para outro e fica apenas a sensação de nevasca na alma. Um coração que recebe tantas pancadas acaba transfigurado no final da vida. Compreensível as pessoas que criam um escudo em novas relações.

Quem já sofreu com uma despedida, não deseja outras. Conheço pessoas que passaram a vida em uma mesma cidade, desde o nascimento até a morte. O resultado são relações fortes, apoio no infortúnio, popularidade e um sentimento de estar em casa: o conhecido nos conforta! Eu morei em tantas cidades desde a infância, cruzei e convivi com pessoas de diferentes localidades e etnias. Perdi de vista amizades importantes enquanto construía ninhos em novas florestas. Mudei de casas, escolas, cidades, países, cidades em outros países. Espero nunca mais ter que me mudar. Sinto que hoje nascem raízes de meus pés.

Com tantos deslocamentos, tenho amigos em lugares distantes e não é fácil encontrá-los pessoalmente. Algumas amizades perduram até hoje e quando nos encontramos parece que foi ontem a última vez que nos vimos, mesmo que tenha se passado meses ou anos. Não nos despedimos, apenas dissemos “até breve”. Outras pessoas desapareceram como grãos de areia em uma tempestade de deserto e hoje sequer sei como estão. Contatos perdidos não são lembranças jazidas. De vez em quando me lembro delas e me pergunto por onde andam, como estão de saúde, como foram tratadas pela vida... Sem o ritual do adeus, nunca superamos a dor da perda.

Além dos amigos e familiares, temos as despedidas dos amores. Algumas são extremamente afortunadas e caminham de mãos dadas desde a juventude até o sono final. Outras nunca sequer provam desse momento de fusão de almas, buscando eternamente por alguém que as ame, algumas vezes se contentando com relações doentias. Outras vezes, encontramos a pessoa perfeita, mas não temos sentimentos por ela – ou ela por nós -, ou temos sentimentos por uma pessoa que não é compatível. Perfeição não existe. Mas dentro da nossa imperfeição é possível encontrar alguém que se encaixe, compensando falhas e nos trazendo equilíbrio, paz e serenidade. Quando duas pessoas fazem mal uma à outra, o único remédio é a despedida. A não ser que haja motivação suficiente para mudar, o que raramente acontece.

Essa despedida é a mais difícil de todas: a que tem que partir de nós. Nesses casos, acenar de longe é permitir que a outra pessoa siga seu caminho e encontre a felicidade em outra ilha. Dizer adeus é dar a Deus quem queríamos que fosse nosso para sempre, pelo seu próprio bem.


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Comentários:

Carlos Bruni disse...
Despedidas significam o fim natural de um ciclo. Qualquer um. Quer nos acostumemos ou não, esse ritual está entranhado na essência do ser e, por mais que o desejemos (se é que desejamos mesmo), isso virá.
Por que não o aceitarmos naturalmente assim como é natural viver e morrer?

sexta-feira, março 25, 2011 8:48:00 PM
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 Anônimo disse...
muito bonito o que vc escreveu parabéns

domingo, março 27, 2011 5:28:00 PM
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 Anônimo disse...
Muito bom o texto.

Tenha um bom dia e obrigado pela lembrança.

domingo, março 27, 2011 5:28:00 PM
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 Anônimo disse...
Olá querida, como vai você? Como vai a vida?

Você já publicou esses lindos textos que tem me enviado em nosso site www.escrita.com.br ? Ele está de cara nova. Acabo de entrar lá e achei que ficou bem legal. O número de visitas também é bem grande. Ele é o site para o escritor.

Um ótimo fim de semana.

Beijos,

Marisa Leão

domingo, março 27, 2011 5:29:00 PM

segunda-feira, 21 de março de 2011

Good night


My heart has broken into a million dying stars, on a dark, dark night.
Neither comets nor planets shall ever candle my journey again.

A etiqueta da amizade


No carnaval escrevi um livro infanto-juvenil sobre o bullying do consumismo. Foi minha amiga Elsa quem sugeriu. Psicóloga, ela trabalha com crianças e adolescentes e comentou o quanto sofrem pais e filhos atualmente com as tentações da mídia.  

O ser humano deixou de andar nu como os índios e passou a ser escravo de si mesmo, numa busca interminável pelo topo de uma imaginária montanha da felicidade vinculada ao status material. Se nós, adultos, nos deixamos sucumbir pela tentação, o que podem fazer as crianças? Considerando que os pequenos não entendem o mecanismo das campanhas publicitárias, como explicar?  Eles não sabem que o cantor preferido muitas vezes nem conhece a fábrica que produz o brinquedo que leva seu nome. Apresentadoras de TV sabem cantar e dançar, mas não sabem como se costura uma roupa ou monta-se um laptop. Precisamos passar às crianças a desvinculação da etiqueta do produto.  Mostrar que ela pode usar um computador sem foto de artista, mas não pode usar a foto do artista sozinha.

 Você pode vestir uma blusa se cortar a etiqueta, mas não pode se vestir somente com etiquetas. No livro, conto o caso de uma bolsa que é feita pela tia de uma criança e custa quatro vezes mais quando ela entrega para a fábrica que só costura a etiqueta com a marca famosa. 

Obviamente temos a questão da qualidade, algumas marcas são vinculadas ao desenvolvimento tecnológico, design e qualidade do produto. Mas cada vez mais essa realidade está mudando. A linha B das montadoras de eletrodomésticos, por exemplo, oferece o mesmo motor, o mesmo formato e só mudam a porta ou painel e o preço cai consideravelmente. 

Tem sido grande a repercussão da campanha de uma cerveja popular por uma cantora que é extremamente “certinha”. Brincadeiras como “Ela é devassa, usa esmalte diferente nos pés e nas mãos” comprovam que o sucesso da campanha foi atingido. Falem mal, mas falem de mim. A cantora já havia dito que não bebe cerveja. Agora ela vende cerveja. Segundo ela, fez uma pesquisa e o produto é realmente bom. Claro, ninguém vai associar sua imagem a um produto péssimo. Mas ninguém vai recusar um cachê milionário se o produto não for excelente. Assim, a concorrência é prejudicada. Quantos bons produtos não podem pagar um cachê desse nível? Enquanto isso, os pais deixam a televisão de babá e não verificam o que o filho assiste. Alguns se sacrificam para dar um tênis que vai para o lixo antes de terminar de pagá-lo. Nas escolas, as crianças destilam o veneno próprio da infância. Quem assistiu ao filme “A Fita Branca”, vai se lembrar das crianças que mentiam, culpavam a outra quando eram pegas, chegavam a machucar os menores e houve até morte. Em outro filme recente, o menino mata a menina porque queria ficar com seu animalzinho de estimação.  Claro que nem todas as crianças são assim cruéis, mas a verdade é que muitas não pensam duas vezes em praticar bullying. Risadas e apelidos são comuns nas escolas. 

As crianças acreditam que precisam adquirir certos produtos para serem respeitadas. A necessidade de inferiorizar o outro é uma busca doentia por sentir-se especial. Essa cultura contemporânea de medir o que somos pelo que temos tem que ser reavaliada. Tem que começar em casa. 

Não adianta falar para o nosso filho não criticar o que os amigos usam, se nós reparamos e valorizamos com comentários do tipo: “Você viu o relógio dele”?”“ Você viu o carro dela?”Ou nos referimos a objetos pelas marcas em vez de usarmos substantivos. Criança escuta, incorpora e transfere. 

Para nossos pequenos serem mais humanizados e menos materialistas, precisamos dar o exemplo. Cada um sabe de suas posses. Ter mais poder de consumo que o vizinho não significa ser melhor pessoa que ele. Os olhos precisam ser educados para enxergar o que realmente importa e que não tem etiqueta.

Como o vento e o perfume das flores.

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Comentários:

Anônimo disse...
Amiga!
Que bacana!
Se vc autorizar, quero colocar no blog paulista.
Bj,
Regina

terça-feira, março 22, 2011 4:27:00 PM
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 Anônimo disse...
Te admiro muito

terça-feira, março 22, 2011 4:28:00 PM
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 Anônimo disse...
Oi Simone, como de costume, uma reflexão para lá de pertinente!!!!!
Bj
Déborah

terça-feira, março 22, 2011 4:32:00 PM
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 Anônimo disse...
Grande texto, querida amiga.
Se vc me permitir, gostaria de postá-lo em um de meus blogs, com os devidos créditos, é claro.
Aguardo sua resposta.
Abraços
Roque

terça-feira, março 22, 2011 4:32:00 PM
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 Anônimo disse...
Muito bom! valeu!


Salete

terça-feira, março 22, 2011 4:32:00 PM
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 Anônimo disse...
Si, você está craque em críticas.Assunto, composição, explanação. Texto limpo. Dá prazer de lê-lo e ainda provoca reflexão. Amei!
Beijo
Repassando...

Rosana

terça-feira, março 22, 2011 4:33:00 PM
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 Anônimo disse...
Parabéns, adorei!
Te desejo um lindo fim de dia...Gabyz

terça-feira, março 22, 2011 4:33:00 PM
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 Anônimo disse...
Texto educativo bem feliz!
Bem escrito, com sequencia e lógica.

quarta-feira, março 23, 2011 7:33:00 AM
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 Anônimo disse...
Ops! Adorei a crônica

quarta-feira, março 23, 2011 7:34:00 AM
 Anônimo disse...
Muito bacana, Simone! Show!
Alex

quarta-feira, março 23, 2011 7:34:00 AM
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 Anônimo disse...
Ótimo texto! Um retrato perfeito do que acontece.
Abraços Carolina

quarta-feira, março 23, 2011 8:02:00 AM
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 Anônimo disse...
Oi querida, hoje é que tive tempo para ler, saboreando, este seu texto; gostei muito. Parabéns!
abç
Domitilla

sexta-feira, março 25, 2011 7:14:00 AM

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Viajando no passado

Eu estava voltando para casa outro dia, ouvindo um CD com uma coletânea de músicas dos anos oitenta. Distraída, eu me deixei levar pelo som em um tobogã de rápidas lembranças. A música tem esse poder. É uma prece que nos coloca em contato com o celestial, levitando nosso corpo e permitindo que nossa alma liberte-se das terrenas preocupações. Eu gostava muito daquela música, mas foi somente agora que percebi o solo de violinos. Eu que amo violinos, os ignorava quando mais jovem. A infância é assim, nunca estamos em silêncio. Envelhecer tem suas vantagens. 

Naquela época, as crianças andavam soltas pelas ruas, encontrando-se após as aulas para brincar ou fazer trabalhos escolares. As maioria das mães não trabalhava fora, então o café da tarde era normalmente com bolinhos de chuva ou bolo de chocolate, feitos na hora. A educação da criança era quase tribal: aprendíamos umas com as mães das outras. Na saída, uma mãe costumava dizer: “Não toque a campainha insistentemente, apenas uma vez e aguardem!”. A outra, mais preocupada: “Nunca conversem com estranhos”. Os avôs nos contavam estórias enquanto nos deliciávamos com o cheiro de café com leite e pão quente – caseiro, claro - com manteiga.

Havia também a casa dos avós, muitas vezes no mesmo quintal. Alguns que haviam partido, outros que moravam com os filhos, mas o lar permanecia ali, um museu de móveis antigos e cristaleiras de diamantes. Na casa de algumas amigas, estudávamos nessas casas desabitadas, desde que prometêssemos não mexer em nada. E não mexíamos! O passado assoviava em nossos ouvidos que aquele templo merecia respeito.
Quando não bastava consultar na Enciclopédia Barsa, íamos à biblioteca emprestar livros, fazíamos cópias e passávamos a tarde elaborando alguma tarefa. Uma de minhas amigas, a Sonia, a mais habilidosa de todas, desenhava muito bem. Lembro-me de um Padre Anchieta que ela pintou na capa de veludo preto, belíssimo. Não havia obviamente internet, “copiar e colar” como hoje. A criatividade, o trabalho em grupo, o aprendizado com as diferentes famílias nos tornava pessoas emocionalmente mais maduras.

Eu sempre fui péssima em artes, mas adorava estudar. Outra amiga gostava muito de desenhar, ela fazia meus mapas e eu corrigia a lição dela de matemática. Isso foi antes do ensino médio, quando eu ainda entendia a matéria. Depois, deixou de ser algo que eu dominasse e até hoje me perco em álgebra e equações de diversos graus. Tínhamos uma professora japonesa – quem nunca teve um professor ou professora oriental? – que “deixava” todos os alunos de recuperação de inglês. O inesquecível nome dela era Tieko, uma senhora franzina e delicada de meia idade, mas para nós – alunos-, era como se um dinossauro entrasse na classe quando a víamos, de puro medo. Tudo besteira, ela gostava de disciplina, mas era carinhosa com os alunos. Eu gostava de idiomas e era sua assistente nas épocas de recuperação.

Nós alunos nos ajudávamos, não podíamos pagar professor particular. Havia interesse em passar de ano e respeito, muito respeito pelos professores. A diretora da escola era a figura máxima de autoridade. Ser convidado a conversar com ela era sinal de problemas muito sérios. Hoje, as crianças não respeitam nem os pais, que passam pouco tempo com elas e muitas vezes não sabem como foi o seu dia, se tinham trabalhos escolares, se comeram bolo no café da tarde ou se choraram a tarde toda porque brigaram com um coleguinha. Os pobres professores são atacados verbalmente – quando não fisicamente – e os pais quando chamados os protegem e procuram culpados outros.

Pensando nisso, Deus fez o domingo para pais e filhos se confraternizarem e resgatarem um pouco desse contato cotidiano que hoje não é mais possível. E para que nós, adultos, saibamos a importância da infância, Ele fez a música, que tem o poder de nos transportar no tempo num piscar de olhos, desconectando-nos de nossas preocupações e permitindo que reflitamos sobre o que desejamos para os nossos pequenos.


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Comentários:


Anônimo disse...
Oi, Simone querida!
Postei sua matéria no meu blog particular. Ri bastante, lembrando de uma professora de matemática, Japonesa, puquuena e magra, era nosso terror. Havia alunas que tinham dor de estômago qdo ela entrava na sala. Teve um ano que ela deixou todas as alunas de "segunda -epoca", não havia recuperação. Nem sei como consegui passar de ano! Enfim, tudo passa. Ficam as lembranças pra quem, como nós tem boa memória, não é?
Bj e obrigada,
Regina

--
Regina Sormani
coordenadora regional AEILIJ SP

domingo, fevereiro 27, 2011 10:40:00 AM
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 Anônimo disse...
Parabéns e para ficar no clima: Nota 100, com louvor.
Ico

segunda-feira, fevereiro 28, 2011 4:49:00 PM
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 Anônimo disse...
Bela transposição para a nossa memória de hoje, daqueles tempos maravilhosos que tão bem você colocou nessa crônica,

Meus parabéns e obrigado, por fazer recordar daqueles momentos tão inocentes de nossa época de juventude.

Abraços extensicos à sua família.

segunda-feira, fevereiro 28, 2011 4:50:00 PM
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 Anônimo disse...
SI,MEU AMOR!!!!!
TÔ COM SAUDADE DE VC,NÊGA....
SUAS HISTÓRIAS SEMPRE TÃO GOSTOSAS,ESSA ME FEZ VOLTAR LÁ PRO SESI,E PRO ANA PAES...
TEMPOS LINDOS(NÃO QUE O TEMPO PRESENTE NÃO SEJA LINDO,COM NOSSAS CRIAS,NOSSAS DESCOBERTAS DE VIOLINOS NO ARRANJO TÃO OUVIDO,MAS AQUELES TEMPOS,MEU DEUS...)
É SEMPRE UM PRAZER LÊ-LA,SI.

segunda-feira, fevereiro 28, 2011 9:27:00 PM
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 Sonia Sambra disse...
Si...lembro-me desse Padre Anchieta...rsrs... lembro até que esse nosso trabalho ficou exposto. Nossa que orgulho né??... Eu tenho alguns desenhos aqui em casa qdo fiz um curso em 92, 93... depois disso não desenhei mais. Mas... é incrível vc resgatar essas memórias. O tempo inesquecível...rsrs

quinta-feira, junho 23, 2011 5:22:00 PM

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Therezinha D. Brissola - UBT São Paulo


A Therezinha fez uma trova em minha homenagem que sou obrigada a publicar, emocionada:

Há certos dias tristonhos
em que um livro me faz bem
e enquanto não tenho sonhos
vivo dos sonhos de alguém.

Obrigada, minha querida irmã de sonhos!

Outra dela:

Se a cruz é leve ou pesada,
para quem crê, não importa...
Deus nos dá, para a jornada,
o peso que a fé suporta!

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Abandono


Você partiu sem despedidas nem explicações
Eu busquei respostas no passado que preenchessem o vazio
O porta-retrato no lixo eu recuperei
Um pijama que não será lavado
Mosaico da tua presença impregna os sentidos
Lembranças de frases jogadas:
“Controladora...”
“Enruga as minhas asas...”
“Vai: destranca a gaiola...”

Era um ninho aberto
Você não sabia?
Enruguei minhas asas porque quis
Subi grades imaginárias
Em minha volta
Agora
Não beijarei flores perfumadas ,
Caminharei por becos imundos, sozinha

Sem você, não sou borboleta
Sou lagarta, agarrada, desconfiada

Do que tenho medo? Não é medo de cair.
É medo de te ver voejar em outro jardim.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Trovas maravilhosas


Fernando Pessoa

O poeta é um fingidor
finge tão completamente,
que chega a fingir que é dor
a dor que deveras sente.

Olavo Bilac:

Mulher de recursos fartos!
Como é que está impenitente,
tendo no corpo dois quartos,
dá pousada a tanta gente?

Menotti Del Picchia:

Saudade, perfume triste
de uma flor que não se vê.
Culto que ainda persiste
num crente que já não crê.

Mário de Andrade:

Teu sorriso é um jardineiro,
meu coração é um jardim.
Saudade! Imenso canteiro
que eu trago dentro de mim.

Cecília Meireles:

Os remos batem nas águas:
têm de ferir para andar.
As águas vão consentindo
- esse é o destino do mar.

Carlos Drummond de Andrade:

Solidão, não te mereço,
pois que te consumo em vão.
Sabendo-te, embora, o preço,
calco teu ouro no chão.